Ao longo dos anos tenho buscado na dança maneiras de investigar o estado presente das coisas. As possibilidades são infinitas já que o presente que aqui está já não é mais, quando se faz possível nomeá-lo. Esse frescor, esse estado de antecedência parece só poder se construir a partir da existência do afeto, isto é, do fluxo contínuo que pertence ao dinamismo do campo relacional, quando afetamos e nos deixamos afetar.
Sempre mais que um corpo existe, descontinuado no outro, permeado pelo espaço, ativando temporalidades. O eu do agora é o eu de muitos, atravessado por matérias, memórias, ancestralidades. O eu é o outro, e é capaz de acionar distintas constelações a cada novo encontro.
Como desdobramento de uma residência artística, tive a oportunidade de conduzir um processo de criação com cinco artistas que se abriram ao encontro, às possibilidades de dançar o inominável, de atualizar o espaço pela improvisação cênica. Neste percurso de pesquisa, alguns materiais foram visitados, como a obra da artista plástica Amélia Toledo, que nos faz refletir sobre a concretude e a efemeridade sobre a qual pertencemos, e sobre as singularidades, que só existem pelo coletivo. Destes cruzamentos surge esta nova obra de dança.
Viver nada mais é do que se misturar à vida dos outros*